\\ TERCEIRO SINAL
Sentiu turbulência e teve medo que ela fizesse tudo sair pela boca em vez de pelo lápis.
Por Bruno Pernambuco
Deu uma importância enorme para aquilo que escrevia. Desmediu-se tanto que acabou barrado na entrada. Traçou umas coisinhas pensando em Helena, mas era o amor que tinha escrito aquilo tudo, não ele. Amassou e jogou fora. Comprou um manual de escrita depois um manual para explicá-lo. Tentou um poema para curar a gripe, um para melhorar a audição e três para diminuir chulé. Achou que serviria ao menos para afastar mau-olhado, mas não tinha ninguém olhando.
Sentiu turbulência e teve medo que ela fizesse tudo sair pela boca em vez de pelo lápis. Tapou os ouvidos com cera, não sabia se era pra impedir os pensamentos velhos de escaparem ou os novos de entrarem. Pensou na promoção do emprego e desistiu de pensar. Viu que a porta estava aberta e se trancou pro lado de fora. Escreveu da janela e quase caiu. Pensou num suicídio passional, mas não quis sentir saudade do gato.
Despertou as crianças a sangue frio. Meteu as mãos pelos pés na cozinha. Desjejuou com um beijo e despediu-lhes com café no rosto. Botou-lhes o gato dentro da mala e serviu ração para as merendas. Sentou-se novamente, e foi bater à porta da pedra. Ela não tinha porta.
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