\\ ME OUVE!
as eletrônicas da vovó e o rock progressivo do meu pai se fundem num grande megazord de músicas que nenhum dos dois gostam, mas eu amo.
Por Victória Novais
Durante o longo intervalo entre o último texto da coluna e este — longo intervalo pra mim no caso que estou escrevendo — me permiti dedicar uma generosa quantidade de tempo pensando nos desdobramentos dessa coluna. Que tipo de música exatamente eu traria para cá e por quê?
Acontece que, como eu bem disse no último encontro, sou uma pessoa extremamente eclética; o que no caso do desenvolvimento de uma coluna de música está sendo mais um empecilho que uma ajuda. Por isso, pra transpor essa barreira, eu decidi seguir por um caminho aqui que não tenho a possibilidade de seguir na vida real por vários motivos que não vêm ao caso agora — e a final é pra isso que nós escrevemos, não é?
Lembrei espontaneamente, num dia qualquer, dos primeiros sons que eu ouvi por mim mesma. Sabe aquela primeira banda, artista solo ou gênero musical que tocou seu coração sem que você tivesse sido exatamente influenciada por ninguém? Então, pra mim, dois álbuns foram os grandes responsáveis por essa epifania — que até hoje eu não tinha me dado conta que se tratava de uma epifania — quando eu tinha uns 10 anos de idade.
O primeiro foi o álbum FutureSex/LoveSounds do Justin Timberlake lançado em 2006, mas que chegou pra mim em 2007 através de um MP3 que eu ganhei de natal do meu padrinho e que já vinha com esse álbum baixado. O segundo na verdade não era um álbum formal, mas sim uma coletânea de 9 horas de músicas eletrônicas das mais capotando o corsa possíveis que eu achei na casa da minha vó(?) enquanto explorava o tradicional quartinho da bagunça.
Como eu não lembro exatamente a ordem dos acontecimentos acho que ela não é tão importante assim para o rumo desse texto. Mas meu encontro com esses dois álbuns me fez ter o primeiro contato com muita coisa que influenciou meu estilo musical. Justin Timberlake representando o POP e o R&B que até hoje me fazem chorar (não disse por onde), e as Eletrônicas da Vovó representando um amor sempre mal compreendido por mim mesma pela música eletrônica.
Bom, gente falando de música POP e R&B já tem de penca nesse mundo, e claramente não é por esse caminho que eu não consigo seguir pois fã de pop tem em todo lugar. Sendo assim, por eliminação já deu pra entender que o caminho que eu decidi seguir aqui foi o da música eletrônica, certo?
Agora, acredito que você deva estar possuído pela melhor fantasia senso comum de fã de música eletrônica: O cidadão que vai pra Rave, passa 3 dias fritando com o som estralando na orelha, aqueles copões de plástico de cor neon pendurado no pescoço, energia lá em cima, camiseta tie dye e o braço cheio de pulseirinha de entrada de festival. Mas é aqui que eu entrei à primeira esquerda e você perdeu o comboio.
Como eu estou bem longe do ambiente da música eletrônica por muitos motivos — mas principalmente porque não ter a energia lá em cima — eu nunca tive muito contato com pessoas que compartilhassem esse gosto comigo. Por isso aqui estamos. Porque eu decidi falar sobre os anos de descobertas nesse campo que eu não tive exatamente a oportunidade de compartilhar com ninguém.
Claro que durante os 13 anos que se passaram entre a Coletânea de Eletrônicas da Vovó até os inimagináveis tempos de 2020 muita coisa mudou. Uma criança criada numa casa regida por Pink Floyd e rock progressivo dos mais brabo não passaria ilesa por isso. E é aqui, no que eu venho a apresentar pra vocês nessa coluna, que as eletrônicas da vovó e o rock progressivo do meu pai se fundem num grande megazord de músicas que nenhum dos dois gostam, mas eu amo.
Agora, para oficialmente inaugurar essa coluna, todas essas palavras foram escritas ao som do álbum Caravelle lançado em 2018 pela dupla francesa Polo & Pan no volume mais alto possível. Talvez, se você der play agora no link que está aqui embaixo, você consiga entender melhor do que estou falando. Então faça isso:
Dentre todos os álbuns que eu poderia escolher para começar minha saga de escritora eu escolhi esse por um motivo muito simples. Se você já clicou no link e começou a ouvir essa maravilha de disco deve ter percebido o tom lúdico que ele tem, né?
De repente você foi transportado pra um filme antigo da Disney, naquela época que as animações estavam na linha tênue entre o fofo e o assustador. Como não fui uma criança criada base de filmes da Disney, meu interesse por essa estética é justamente por ela beirar o macabro em vários sentidos.
Esse álbum apareceu pra mim quando uma de suas músicas começou a tocar como sugestão do algoritmo enquanto eu ajudava uma amiga a embalar a casa para mudar. E como uma boa millenial que sou, aceitei a sugestão do algoritmo e parei pra pesquisar da onde vinha aquela música.
Foi quando eu parei pra ouvir o álbum sozinha em casa que o pensamento de “qual foi a primeira música que eu curti ouvir sozinha?” veio na minha cabeça. Todas as lembranças da coletânea de músicas eletrônicas da vovó, do álbum do Justin Timberlake estralando no fone do meu MP3 e toda aquela história que eu contei hoje foram resultado dos 75 minutos de reflexão que esse disco me proporcionou. Talvez ele possa fazer o mesmo por você, então não deixa de conferir.
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