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Cachorro sem pedigree

\\ CRÔNICAS


‘Capital nacional’ do cachorro quente, a cidade satélite de São Paulo perde apenas para Nova York, mundialmente


Por João Tognonato, Especial para Frente & Versos

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Reprodução/Estadão


Desde o início dos tempos geógrafos dedicam noites debaixo dos livros e suam suas camisetas xadrez à procura de definições precisas para nomear os diferentes tipos de aglomerados urbanos – Povoados, colônias, vilas, aldeias, cidades espontâneas, cidades planejadas, metrópoles nacionais e metrópoles globais são apenas alguns termos encontrados através do trabalho árduo destes intelectuais tão famintos por classificações. Neste turbilhão de conceitos a capital paulista se inclui no mais intrigante e complexo deles – A região metropolitana. O termo refere-se a aglomerados compostos por um denso núcleo urbano e suas áreas vizinhas. Tais áreas vizinhas, também chamadas de subdistritos contém uma diversidade cultural ainda pouco conhecida na Grande São Paulo. Dentre elas, uma em especial detém não só certa mística particular, como também o título de Capital mundial do Cachorro Quente, a cidade de Osasco.

A entrada do município fica entre a tríplice fronteira, conectando os bairros da Vila Yara, Vila Lageado e Parque Continental, onde instalou-se um pequeno comércio de frutas e legumes. Grandes letras de concreto formam sobre um gramado o nome da cidade, traçando ali, a linha que separa a capital do estado. Ao cruzar o caminho sem volta e andar alguns metros pela avenida principal, avista-se no horizonte o cartão postal da cidade. A ponte Metálica com aproximadamente 300 metros, feita com vigas de metal em arquitetura futurista, recebe o nome do baluarte da emancipação osasquense, Reynaldo de Oliveira, de quem se orgulham seus mais de 700 mil moradores.

Seguindo em frente chega-se ao calçadão, onde as primeiras barraquinhas já dispersas nas redondezas da rua Antônio Agú se encontram. Não há muitas vagas para veículos, a pé acaba sendo a melhor opção. A calçada é feita com grandes chapas quadradas de concreto contendo duas faixas amarela nas laterais para auxiliar a locomoção de deficientes visuais. Um grande ralo acompanha toda sua extensão rodeada por bueiros e alguns canteiros preenchidos com longos pés de Coqueiros Imperiais.

Numa extremidade da rua, o Shopping Osasco Plaza concentra a maioria dos pedestres enquanto no outro, dois solitários policiais fiscalizam as vendas de meias e brinquedos organizadas por alguns marreteiros. Lojas de roupas populares oferecem todo tipo de moda feminina e masculina sendo predominantes no comércio do calçadão. Paralelamente, outros estabelecimentos são responsáveis pelo suporte ao mercado de cachorro quente, comercializando pão, condimentos, refrigerante, gelo e disponibilizando estacionamentos para os vendedores guardarem seus carrinhos.

É nesse espaço que estão situadas as barraquinhas. Nenhuma é maior que a outra, nenhuma carrega uma logomarca especial ou algum tipo de sinal luminoso que atraia a atenção, e nenhuma cobra mais de R$3,50 um cachorro quente simples mantendo em R$3,00 a média de preço. A receita básica do lanche é aquela já conhecida: Pão, salsicha, purê, milho, ervilha, batata palha, ketchup, mostarda e maionese, não sendo permitida a prensagem do sanduíche. A prefeitura cuida de estabelecer regras para um rodízio entre os vendedores, pois a quantidade de pessoas vivendo do lanche é maior do que o espaço disponível às barracas. Idosos e Deficiente físicos tem prioridade na escolha, enquanto os outros vendedores alternam seus pontos. Há também revezamento nos dias da semana, então, dependendo da data, existe a chance de não encontrar seu dogueiro favorito.

Uma dessas vendedoras é dona Ilda, que me introduziu ao universo do cachorro quente. Trabalhando na área há mais de trinta anos, a simpática ‘doguete’ explica o “Boom” do tradicional lanche germânico: “As empresas foram embora de Osasco, muita gente desempregada… então foi onde a prefeitura deu carrinho. Eram quatro carrinhos só: O corintiano, a Janete, seu Arlindo e a Dibi. Cada carrinho dava emprego à no mínimo quatro famílias, tinha o fornecedor que vendia o pão, nós que fazíamos o purê, salada. Era tudo feito em casa.”. Ela conta que conforme o tempo foi passando, mais pessoas abriam barraquinhas, até ser necessária a criação de uma regulamentação. O jeito de se adaptar foi trabalhar até mais tarde nos dias licenciados e usar os outros para atualizar o armazém… “Então assim… o cachorro quente pra mim foi minha vida. Eu consegui criar quatro filhos, e deus me deu a graça de criar mais dois adotivos. Sou grata por isso” Completa.

A boa convivência e a harmonia entre os vendedores, junto com os mais de quarenta mil lanches vendidos diariamente, fazem deste lugar a capital mundial do cachorro quente. Dona Ilda não se importa que em número de vendas Osasco ainda fique atrás da cidade de Nova York, nos Estados Unidos. Ser uma capital mundial vai além de dados quantitativos ou avaliações de chefs gourmet. Para receber esta alcunha é preciso inserir o cachorro quente no dia a dia e fazer desta atividade – tão singela – um motivo de orgulho para seus moradores. E isso, Osasco consegue fazer com perfeição.

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