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Abre de sésamo, fecha-te boca

\\ CADERNO DE ANOTAÇÕES

“Você sabe o que é um Mucururú?”. Não sabia. E a resposta foi surpreendente: “É um urucunguá que aviansá no interité do ibaritibu”.

Por Matheus Lopes Quirino


Ilustração de Ligia Zilbersztejn.

Nos dias em que meus ouvidos se recusam a trabalhar, fico eu desesperado por não ter material para ouvir. Não que seja lá muita coisa interessante, pelo contrário. Não sendo agente da indústria fonográfica, porta-voz de reuniões graúdas, diplomata, líder de causa social, fico eu restrito a alguns balões de conversa que pesco em conversas aleatórias pela rua. Não é nada comparado ao que temos por aí nas paradas de sucesso, mas garanto que os verdadeiros artistas viram sua esquina, tão anônimos como nunca, agora devidamente mascarados.

É gente simples e conversadora. Na sua maioria idosos, comerciantes, donos de bancas de jornais, frentistas, profissionais liberais, vez outra algum artista de rua ou cordelista. Dia desses escutei, meio abafado por causa da máscara, uma genialidade. “Você sabe o que é um Mucururú?”. Não sabia. E a resposta foi surpreendente: “É um urucunguá que aviansá no interité do ibaritibu”.


Impressionantemente, mais lúcido impossível, embora o contexto tenha sido importante para a compreensão total do negócio.


E essa gente é que dá inveja a Guimarães Rosa, com seus dialetos esclarecidíssimos inventados, povoam a cidade aos montes. Não perdem oportunidade para sacar um neologismo. Como Mucururú, que, a meu entender, seria algo como uma zonaiada, outro neologismo, mas mais comum. Por causa das máscaras, dos pedidos acumulados, dos poucos funcionários, o balcão da padaria do bairro virou um Mucururú, e foi difícil desmucururuzar aquela zonaiada toda.


Esses são os bons, que entendem da manha da vida. Agora, há também aqueles extraordinários, sem o prefixo de adição, que falam tão alto que as máscaras não são capazes de abafar frases prontas do tipo: “Para você vencer na vida, precisa acreditar no que diz, se não ninguém escuta”. Escutei e não acreditei em tamanha filosofia. Estava bem na minha frente, subindo a rua Frei Caneca, um candidato fortíssimo à presidência da república de 2022. Comparado ao que temos hoje, aconselharia o rapaz com um abre de sésamo, fecha-te boca, e vamos lá.

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