\\ POEMÁRIO
Por Raí Prado Morgado*, colaboração para Frentes Versos
das últimas lástimas do diário oficial
a forma como os jornais retratam a realidade
carrega um desespero transparente:
uma história sobre aquelas vezes
em que não se tem certeza.
meus chinelos estão gastos de cinco minutos de atraso:
caminhamos a cidade sem orientações de espaço
e isso sempre denuncia nossa maneira.
éramos jovens. não digo inconsequentes:
seja por madrugar conversa aos deuses,
ou pensar que um exemplo de prisão é a escola,
mas das que tentam controlar sua mente.
e de algum jeito ainda dizem
que se está posto que éramos jovens,
é certo que éramos inconsequentes.
ainda somos os mesmos e vivemos
I.
esta cidade se esconde três metros
abaixo dos bueiros afogados
em resíduos, marcha pelo progresso
imaginário
e ainda se diz
a capital do país
apesar de não oficial
II.
deitar nas avenidas e impedir
o caminhão de mover
a economia dos brasis
pelo simples prazer de incomodar
a indústria de notícias falsas
III.
caminhar em círculo pelas calçadas
as plantas dentro de casa
morrem todas
as falsas continuam com as folhas
intactas
mais clandestinas
do que as cápsulas de cocaína
na barriga de quem busca melhorar de vida
ou simplesmente foi coagido
slow ride
a Marília Rubim e Leonardo Galesi
I.
roubar os espantos do mundo
enquanto a linguagem dá saltos
ecoa como o cantar dos grilos
pelas noites de solstício
os risos de uma piada
meio Hermes e Renato
II.
dentro de cada um
existe um artista frustrado
a primeira música do guitar hero
que todo mundo conhece
e ninguém lembra o nome de fato
as manhãs trazem algo de novo
a Isabelle Watanabe
os pássaros parados nos postes
têm realmente
razão. você também está certa
ao observar estrelas
cadentes, que pouco se entendem
do despencar que seria sorte.
o canto é sempre parte do jogo,
mas a culpa demonstra
esse andar de menino
em que pouco escuto são:
os olhos não dizem nada.
louvado seja dionísio,
muitas as garrafas de vinho,
que deus perdoe esse jeito retido
mas agradeça o corpo que vive estrada.
a festa se estende em brasa,
desde a retina até o coração escrito.
entre o pêndulo e a rua,
me esqueci da falta.
***
*Raí Prado Morgado (Caraguatatuba, 1999) estudou Gestão Ambiental na ESALQ/USP, em Piracicaba, e edita a Revista Contempo. Tem poemas publicados em revistas e periódicos literários como Subversa, Vício Velho, Mallarmargens, Aboio, Pixé, Ruído Manifesto, Arribação, e Suplemento Acre, no Brasil, e pelo coletivo MásPoesia, na Argentina.
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