\\ ARTE
Através do Instagram, o Clube do Amor atravessa distâncias para recuperar histórias e trazer de volta o encontro
Por Bruno Pernambuco
O lançamento aconteceu enquanto, naquele 12 de junho, as celebrações do amor passavam à distância. Seis casais fotografavam-se. O exercício delicado e sutil, de mostrar a própria intimidade e, no distanciamento, recuperar as minúcias do toque, da proximidade e do afeto, ficou registrado na memória uma câmera itinerante. “Circular a hoje sucateada Cybershot nos fez lembrar, com saudades, do tempo em que cada um tinha a sua própria Cybershot (e as fotos ridículas que fizemos com elas)”, admite Nicolau Spadoni, o realizador desse primeiro projeto- retraçar esses elos é reconstruir o sentido da fotografia, e assumir de maneira autoral a fragmentação do “olhar fotográfico”, resultado da profusão dos aparelhos pessoais.
A série, que continua a ser desvelada até o dia 12 de julho, foi a primeira ação do Clube do Amor. A diretora do projeto, Julia Chiaradia, admite que tudo nasceu da tentativa de ocupar o ócio, trazido pela quarentena e pela falta de oportunidades em sua área, a direção de arte. “A ideia do clube é, sobretudo, ser um lugar de encontro, de diferentes pessoas, diferentes marcas, e projetos que estejam acontecendo”. Inspirações, desejos e projetos que já fluíam encontraram-se, então, na oportunidade de dar corpo a esse encontro. Foi assim que se reuniram sete marcas- algumas de conhecidos que se interessaram pela ideia, outras de estranhos que, nas conversas, juntaram-se à rede- de roupas e acessórios, para essa primeira ação: as cartas de amor. “Algumas das marcas vieram falar comigo, me contaram como a ação movimentou as vendas, que andavam paradas nesse momento”, comenta Julia. As fotos que expõe sutil ou saturadamente os produtos desses parceiros- em looks combinando, em poses cuidadosamente planejadas para o registro ou numa aparição mínima desses objetos no momento de afeto- falam do apartamento dos abraços, da incomunicabilidade com o outro e consigo mesmo, da semelhança e da diferença daquele que se ama, da memória viva na pele do peso delicado que a jóia produz ao tocar a epiderme.
Essa primeira carta escrita pelo Clube tem, também, uma dedicatória: o Pela Vida de Nossas Mães, coletivo de filhos e filhas de empregadas domésticas, organizado como forma de garantir a segurança de quem é exposta à vulnerabilidade e à exploração, vivendo no avesso das medidas de prevenção ao coronavírus. Esse engajamento da ação, e o seu resultado concreto, na forma da porcentagem dos lucros doada pelas marcas participantes durante o período de arrecadação da campanha, trazem um outro sentido do que é a lembrança do amor no tempo de separação. Especialmente após o caso do menino Miguel, que pôs em evidência a realidade dessas mulheres, pôr em prática essa ação é relembrar vidas que são tornadas invisíveis- não só deixadas de fora desse mundo pelo qual circulou a velha cybershot, ou do público pelo qual circula uma publicação como a que o leitor visita nesse exato momento, mas, no discurso comum, deixadas de fora do afeto, da emoção, do cuidado, do descanso, da humanidade.
Já está no forno a próxima ação do clube: um livro, de poesia e prosa, com trabalhos apenas de mulheres. Além de uma editora que possa tirar o projeto do papel (ou colocá-lo nele), o Clube também procura reforços para o time de autoras, que possam diversificar e ampliar as perspectivas do grupo. “Nossa ideia é sempre ter uma ação em andamento, sendo divulgada no Insta”, explica Julia. “As Cartas de Amor vão ficar até o dia 12, quem sabe depois a gente consiga entrar direto com o livro… Vamos ver!”. De qualquer forma, é certo que essas primeiras cartas, que tão lindamente falam de amor, são apenas o começo da história desses encontros. Quais outros virão, e que emoções virão com eles, não dá pra saber. Só é possível ficar, no íntimo, com a lembrança do toque do afeto no coração, e preparar os olhos para esses novos encontros que, nem só no Instagram, aos poucos voltam a acontecer
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