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Autoras fazem itinerância pelo sentimentalismo poético em suas obras
Por Giovana Proença
Imagem/ reprodução
Ana Cristina César e Ana Martins Marques: ultrapassando o primeiro nome, autoras compartilham identidade poética permeada por sutilezas nas descrições que mesclam emoções íntimas e cenas cotidianas, revelando paradoxalmente a força do desvendamento do sentimentalismo presente em suas obras. “Pela primeira vez infrigi a regra de ouro e voei para cima sem medir as consequências”, escreve a carioca Ana Cristina César em “Mocidade Independente”.
A poeta é expoente da Poesia Marginal que emergiu na década de 70, chamada geração mimeografo devido as formas alternativas que usavam para reproduzir seus textos, de modo que Ana não poderia prever que continuaria voando para cima com a força poética de sua obra – que funde prosa, poesia e ensaio, tendo sido a autora homenageada da FLIP em 2016.
Xará da poeta carioca, a mineira Ana Martins Marques, metal precioso da lírica contemporânea brasileira, renova a tradição e mantém o legado dos grandes nomes da poesia de seu estado. Com a tônica de traduzir o mundo, ainda que reconheça sua fragmentação e as coisas que o compõe, a lírica da autora de O livro das semelhanças (2015) centra-se no intimismo do cotidiano, na redefinição de lugares poéticos e dissolução da própria geografia na poesia, na qual cada item transpira lirismo.
“Você fez questão de dobrar o mapa de modo que nossas cidades distantes uma da outra exatos 1720 km fizessem subitamente fronteira”
(Ana Martins Marques, O livro das semelhanças)
Efervescendo ao máximo respectivamente em A teus pés e no Livro das semelhanças as cenas aparentemente banais construídas poeticamente por Ana Cristina César e Ana Martins Marques adquirem sentido ao fundir-se com as emoções, de modo que o sentimentalismo é exposto e revelado em camadas, sustentado pelo intimismo e pela sutileza de duas escritoras que elevam sua força poética ao convidar o leitor à visitar suas cenas e sentimentos ardentes que ebulem em meio ao minimalismo de elementos ínfimos.
“Dedicatória
Ainda que não te fossem dedicadas
todas as palavras nos livros
pareciam escritas para você”
(Ana Martins Marques, O Livro das semelhanças)
“Te amo estranha, esquiva, com outras cenas mixadas ao sabor do teu amor”
(Ana Cristina César, A teus pés)
O sentimentalismo amoroso emerge como mote e lugar comum na poesia dessas duas mulheres, fugindo de clichês românticos e cruzando as fronteiras de amor e desejo no desvendamento de sentimentos que pulsam e não resignam-se a ser interiorizados, seja na sutileza da dedicatória de Ana Martins Marques ou no estranhamento da sinestesia de Ana Cristina César. Dessa forma são expostas as facetas da intensidade lírica do sentimentalismo, cuja potência não é perdida revelando-se como sussurro ou como grito.
Compartilhando mais do que o primeiro nome, as identidades poéticas dessas duas escritoras coincidem na composição de suas cenas que fundem-se ao sentimentalismo, de modo que permeadas no intimismo confessional, as poéticas de Ana Martins Marques e Ana Cristina César convidam o leitor a desvendar as emoções que envolvem suas viagens de ônibus e cruzadas pelo estado rumo ao amado desconhecido, com eu líricos profundamente delineados e tomados pela paixão. Mais uma semelhança? Ambas te deixarão aos seus pés.
Indicações
Aos teus pés
Ana Cristina César (1982), reedição/2016 Cia. das Letras
144 páginas
*
O livro das semelhanças
Ana Martins Marques (2015), 1° edição Cia das Letras
112 páginas
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