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Debate no SESC rememora período em que a escritora se aventurou nas páginas dos jornais
Por Matheus Lopes Quirino
(Foto/reprodução)
Como uma das alcunhas dignamente fesceninas da poética nacional, Hilda Hilst chega respaldada pela itinerante programação da Festa Literária Internacional de Paraty, como autora homenageada em 2018. Dentre a múltipla obra da escritora, além da afamada poesia, a crônica – mesmo “exercida” tardiamente – ocupou um espaço considerado libertador para Hilda, permitindo diálogos e interações do público com sua obra, anteriormente fixada em círculos restritos das letras.
Antes mesmo do debate no Centro de Formação e Pesquisa do SESC começar, na última segunda-feira (25), no café do CPF, a jornalista e curadora da FLIP, Josélia Aguiar, comentava a esta reportagem sobre a importância de dar à Hilda seu digno espaço no panteão dos escritores brasileiros: “A programação (da Flip) se fez para contemplar as várias Hilda’s […], o evento de hoje se torna especial por trazer ao público uma face desta nem tão conhecida, como a poeta, por exemplo”. O debate, no entanto, foi capitaneado pelo jornalista Luís Henrique Pellanda e conduzido pelos cronistas Humberto Werneck e Mariana Ianelli.
Autora, não de “meias palavras”, Hilda Hilst foi colaboradora do jornal campineiro Correio Popular entre 1992 e 1995. Suas crônicas — sobretudo as dominicais — remexeram os lares da “Família Tradicional Brasileira”, popularizando ainda mais a escritora. Despindo-se de pudores e constantemente dialogando com questões polêmicas, a então cronista residente da Casa do Sol – seu refúgio da cidade grande na cidade de Campinas – atrevia-se cada vez mais pelas páginas dos jornais.
Hilda Hilst era sacolejada por grandes amores, era uma personalidade gastona (em múltiplos sentidos), lembrava o mediador do debate, Pellanda. Precisando do ordenado extra do jornal, a autora de O Caderno Rosa de Lori Lamby trafegava entre os humores e mau-humores da velhice, expondo em suas crônicas as lamentações e indignações recheadas de bons palavrões com pontos de exclamação e expressões idiomáticas ferinas e singulares de seu universo.
Metendo os pés na porta do botequim crônico, Hilda não só puxou a cadeira para um dedo de prosa com o leitor do Correio, como, frequentemente, a tirava de cena dando, na certa, em um tombo na toada da crônica. “Abrir um jornal de domingo e ir na coluna de Hilda, muitas vezes, poderia ser insuportável, mas as pessoas liam, liam e ficavam espantadas, o efeito era contrário, quanto mais Hilda era Hilst, mais as pessoas a seguiam”. Popularizou-se naquele metiê e, segundo a mesma, pediu demissão várias vezes, como constam os relatos dos próximos a ela, dizia-se assim: “Eles que não deixavam eu me demitir”, lembrou Humberto Werneck, fazendo referência a uma das conversas que teve com a escritora.
Tratando-se de Hilda, pouco importam as confirmações. O fato era fato em si, quando, através dela, histórias e personagens eram tecidas em um mix entre realidade e ficção. Sua prosa, portanto, hora lidava com as complexidades e melancolias humanas, hora exalava tom cômico, como no caso do Esquadrão Geriátrico de Extermínio, que rendeu à autora crônicas antológicas, transcendidas para além da efemeridade diária de um jornal, no volume Cascos & carícias & outras crônicas (Globo, 1998).
HOJE EU ME SINTO LIVRE PARA O FRACASSO!, destacou Mariana Ianelli, sobre a “fase crônica” da escritora. Após a leitura de uma crônica sobre Hilda, a autora Mariana Ianelli destacou a multifacetada Hilda dentro da crônica. “Ela se rebela à raça humana”, dizia Mariana, referindo-se à passagem pelo Correio. Curiosamente, segundo a própria Hilda, a tiragem aumentou, o burburinho alimentava o nome “Hilst”. Amem-na ou odeiem-na, Hilda Hilst diria: “Vocês vão ter que me engolir”. Com um enorme prazer, diga-se de passagem.
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