\\ POEMÁRIO
Por Sibélia Zanon*
Nua
Pequenas placas marrons, secas e rugosas revestem o seu
comprimento.
Rasteja em terras piladas, o corpo confundido em margens incertas.
O chão escamado reflete a sua imagem.
Irmanada à terra, não se reconhece no espelho terroso.
Enxerga apenas o solo que a sustenta, sustém, assusta.
A erosão a completa.
Aconchega-se ainda à pele descolorida, conforto dos caminhos
conhecidos, tons de marrom descansados.
Aquelas cores, um dia exuberantes, em estado de pele virgem,
implicavam em vigília extrema.
E a pele esmaecida de hoje já não lhe cabe, escamas endurecidas,
contenção.
Quando foi que a proteção se converteu em prisão?
Logo será primeira pessoa - EU.
É uma sina saber que não se nasce para encolher. Mesmo quando
esticar dói. Tanto.
Os olhos nublam.
Ondula de um lado a outro e se esfrega em pedra.
A terra é tenra em demasia.
É preciso fricção sem pesar, nenhum titubear.
A pele tem de despir o corpo de uma vez só, com destreza, pelo
avesso, da cabeça à cauda, mantendo olhos intactos.
Em um só estalido: descamar a estreiteza, libertar o que intimida,
devolver à erosão o buraco esvaziado, retomar as cores.
O custo é a nudez.
A crueza da realidade sem escamas.
A verdade de delinear margens.
Crescer não se assemelha a progresso quando é imperativo
reconhecer-se nua.
Me vejo.
Ao menos, a carne é viva.
*Jornalista e escritora, é colunista convidada de Frentes Versos.
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